Devotos expande seu som para novas direções
Breve passeio pela discografia do Devotos: Agora tá Valendo, álbum de estréia da banda, contém o melhor repertório do grupo, embalado naquela que é a pior gravação dele em estúdio. Devotos, o segundo, empata a coisa: repertório apenas regular para gravação idem. Já A Hora da Batalha possui um registro perfeito para um grupo de canções apenas regular. Flores com Espinhos para o Rei deixa algumas questões flutuando no ar: por que a banda não regrava seu clássico álbum de estréia? Se ao vivo o Devotos sempre foi inquestionável, seus discos sempre pecaram por não reproduzir em estúdio a mesma fúria dos shows. Saudosismo à parte, fazia tempo que o grupo não conseguia reunir um grupo de músicas tão poderosas em um mesmo álbum. A temática (quase mono) permanece a mesma: letras de cunho social, abordando política, desigualdade social, conscientização e etc. Musicalmente é que a história muda um pouco de figura. Pois não é que o trio conseguiu ir além dos três acordes viscerais do punk rock? Para ouvidos mais atentos,. Cannibal, Cello e, principalmente, Neilton, derramam camadas discretas de jazz,, rockabilly e até mpb. A levada de guitarra de “Canção para Mudar” é uma pista da diversidade de influências da banda. Parece remeter à surf music. “Sociedade Alternativa” poderia entrar em qualquer disco de rap. Em “Luta Pacifista” entra em cena o Devotos dos tempos de “Vida de Ferreiro“, só que dialogando discretamente com o metal. Enfim, é música para pogar e bater cabeça. “Rádio Comunitária Pra Informar” mostra a criatividade de Neilton, que mesmo nas limitações dos três acordes consegue injetar influências de outros gêneros. “Espírito Guerreiro” é de um balanço inédito na carreira da banda, sem, contudo, abrir mão do peso. Mas a melhor notícia de todas é a seguinte: Cannibal permanece indignado. Enquanto ele estiver gritando inconformado, tudo estará em paz para o Devotos. Até música para as rádios o disco tem (caso elas tocassem rock). Trata-se de “Tudo Faz Sentido“, com participação certeira de Adilson Ronrona, do Matalanamão. E “Por Isso Não Tente Calar Meu Grito” flerta com, veja só, o samba! O álbum só não leva cotação máxima porque Cannibal definitivamente não nasceu para cantar reggae, como tenta fazer em “Danças das Almas“, música que conta com a participação alucinada de Lirinha. Mas quando ele berra, na abertura do disco, “brincando do jeito que dá/ bala perdida não me acha/ vida longa à polícia militar/ que quando sobe é só desgraça”, a gente até esquece tal tropeço.
Cotação – bom