Cobertura feita por Bruno Arrais
Chevrolet Hall, 27 de abril de 2008, última noite da 16ª edição do festival Abril Pro Rock; um domingo – dia um pouco inconveniente para sair de casa à noite para um festival de rock, ainda mais pela enorme quantidade de chuva despejada dos céus. Mesmo assim, cerca de cinco mil pessoas de toda a região Nordeste reuniram-se na casa de show para assistir às apresentações de duas das mais antigas e influentes bandas de um nicho muito caro aos apreciadores do heavy metal: o heavy melódico.
Ao Helloween podemos atribuir a criação desse gênero. Foram eles que em meados da década de 80 trouxeram à vida os álbuns que definiriam os caminhos a serem trilhados por milhares de bandas seguidoras do estilo em todo o mundo. Já o Gamma Ray é uma banda mais “nova”, formada por Kai Hansen – fundador do Helloween –, que no final do ano de 1988 deixou a banda incomodado com o caminho que ela vinha trilhando – grandes turnês, envolvimento de membros com drogas, desentendimentos pessoais entre os integrantes etc.
Durante toda a década de 90 essas duas bandas levaram suas carreiras num certo clima de rivalidade; uma coisa meio Beatles e Rolling Stones – guardadas as devidas proporções – do metal. Mas, agora, 20 anos depois, as duas uniram forças para viajar pelo mundo tocando juntas na turnê Hellish Rock ‘07 / ‘08.
No último mês a turnê tomou o rumo da América do Sul, com passagem pelo Brasil, incluindo Recife em seu roteiro de viagem; o que nos trás de volta ao Chevrolet Hall na noite do domingo 27.
Às 19h já havia uma grande concentração de headbangers na entrada da casa de shows. Às 20h o público adentrou as portas para assistir à apresentação. Havia um clima de grande expectativa, bem como de confraternização, afinal de contas as duas bandas eram velhas conhecidas do público pernambucano (e alagoano e baiano e paraibano…) e a vinda delas era esperada há mais de 15 anos – falo por experiência própria. Este evento foi, para a maioria do público ali presente, a realização de um sonho antigo.
Finalmente, às 21h, aproximadamente, os alto-falantes anunciaram a primeira banda a subir ao palco: Gamma Ray. Quando as cortinas se abriram, todos os presentes saudaram a banda com grande calor. E eles abriram o set com Into the Storm, primeira faixa do último disco, Land of the Free 2, que foi seguida pela clássica Heaven Can Wait – do álbum Heading for Tomorrow, seu debut –, que fez a platéia vibrar mais ainda e cantar junto cada palavra da letra. E foi uma noite de clássicos. Kai Hansen e seus companheiros executaram músicas de toda sua carreira, prestigiando o público com suas favoritas e deixando todos muito satisfeitos.
Para mim, particularmente, um dos grandes momentos do show se deu quando o Gamma Ray tocou Land of the Free – na minha humilde opinião seu clássico maior –, emendando-a com a espetacular Heavy Metal Universe, dando a costumeira parada para que a platéia cantasse em uníssono o refrão “It´s a Heavy Metal Universe!!!” e batesse palmas. Nesse momento Hansen tomou nas mãos uma bandeira do Brasil e disse que era a bandeira do universo do metal, cativando de vez – se é que era necessário – o público. Outro grande momento foi a execução de Ride the Sky, música do disco Walls of Jericho, primeiro LP do Helloween, de 1985. Com esta música o Gamma Ray incendiou a platéia, que se espremeu o mais próximo possível do palco, completamente bestificada, cantando a plenos pulmões.
Foi um grande show, em que a banda mostrou que, apesar de somar aproximadamente duas décadas de estrada, continua em grande forma, pronta para encarar mais duas décadas de composição, gravação e turnês; como também mostraria o Helloween, em seguida. Amém.
Após um breve, mas tenso, momento de espera, a apresentação do Helloween fez a alegria dos presentes, muitos dos quais, fãs da banda por mais de vinte anos; metaleiros das antigas. Andi Deris, Michael Weikath, Markus Groβkopf e os “novatos” Sascha Gerstner (guitarra) e Dani Löble (bateria), fizeram uma apresentação impecável, digna de uma carreira sólida de quase três décadas de existência.
A exemplo do Gamma Ray, a apresentação do Helloween prestigiou o público com músicas de todas as fases de sua carreira. A abertura foi feita com a canção épica de mais de 13 minutos Halloween, do álbum clássico Keeper of the Seven Keys, Part 1, pondo imediatamente abaixo o Chevrolet Hall. Na seqüência, Sole Survivor, primeiro hit da Era Deris, música ultra-pesada que levou os bangers à loucura, deixando muitos, mais veteranos como eu, com uma baita dor no pescoço.
E foi uma verdadeira celebração, hit atrás de hit: March of Time (Keeper 2); a nova As Long As I Fall, primeiro single retirado do álbum Gambling With the Devil, que agitou principalmente os fãs mais novos; outra do Keeper 1, a balada A Tale That Wasn’t Right; seguida de um solo de bateria endiabrado de Dani Löble, que aproveitou inclusive para nos prestar uma homenagem incluindo ritmos brasileiros em seu solo; King For a Thousand Years, do recente Keepers of the Seven Keys – The Legacy; Eagle Fly Free, levou todo mundo à loucura, cantando e batendo palmas; depois The Bells From the Seven Hells; I Wish I Could Fly; e, para “encerrar”, outro clássico da Era Kiske, a faixa 5 do Keeper of the Seven Keys, Part 2, Dr. Stein.
A banda saiu do palco deixando o público sedento por mais, gritando “Happy, happy, Helloween” e “Helloween, helloween”. Após alguns minutos voltaram e executaram um longo medley que felizmente aplacou a sede dos fãs: I Can / Where the Rain Grows / Perfect Gentleman / Power / Keeper of the Seven Keys. Ao fim do medley, abandonaram o palco novamente, deixando o público em grande expectativa, pois a tour Hellish Rock trazia uma “surpresa” especial: uma apresentação conjunta das duas bandas.
E como prometido, após um breve intervalo ao fim do show do Helloween, as duas bandas subiram juntas no palco para o êxtase de seus fãs, antigos e novos. Foi um verdadeiro encontro de titãs, jamais visto no Recife. Já fui a muitos shows de Heavy Metal aqui na cidade – Angra (com e sem André Matos e companhia), Merciful Fate, Blind Guardian, Stratovarius, Blaze, Di´Anno etc. –, mas nenhum foi tão gratificante quanto este. Juntas, as duas bandas tocaram dois dos maiores clássicos do Helloween, da época em que Kai Hansen ainda integrava a banda: Future World e I Want Out. Foi o momento mais belo de toda a noite, em especial quando Kai Hansen e Michael Weikath tocaram o duelo de guitarras de Future World lado a lado, com grandes sorrisos nos rotos.
Uma noite inesquecível como Recife nunca viu. Uma noite para guardar na memória e torcer que não demore mais 15 anos para que se repita. Torçamos para que os produtores locais continuem acreditando no verdadeiro rock e proporcionem mais espetáculos dessa magnitude com maior freqüência. Stay heavy!
7 Comments
Voces esqueceram o nome do guitarrista e fundador da banda helloween. Michael Weikath.
Oops! My bad! Foi mal, Bruno. Troquei o nome do Michael Weikath com o do Kai Hansen, no line-up do Helloween. Pedirei a Hugo ou Guilherme para corrigir. Quando à fundação da banda, quem fundou mesmo foi Kai Hansen, com outros nome. Weikath entrou depois. Quando fizeram a primeira gravação sob o nome Helloween ele já estava na banda. Na minha opinião, ele pode ser considerado integrante original, mas fundador não.
AHHHHHHHHH IT’S HELLOWEEN!!!!
Land of the Free = Rebellion in Dreamland?
I Wish I Could Fly = If I Could Fly?
The Bells From The Seven Hells = The Bells of the Seven Hells?
Foi realmente um show do caralho. Diria que um dos melhores de Heavy Metal já produzidos até agora na cidade. Só acho que a produção do Abril pecou em realizar o festival no Classic Hall, todo aquele clima de grande evento “plural”, que o Abril pro Rock teve, foi perdido.
No show do Hello/Gamma sequer teve feirinha! Sem falar nas barracas de comida, que deixavam a desejar. Faltou estrutura para os fãs.
Texto extraído do meu Blog
Olá pessoal.
Acabei indo para o último dia do festival Abril Pro Rock no dia 27, mesmo não sendo contratado. Fui para me divertir e ver se aprendia algo novo, pois neste ramo (e em quase todos!) tem sempre o que se aprender todo dia. Como sou amigo do pessoal do som, levei todo meu material de trabalho para o caso de precisarem de ajuda, mas foi tudo tranqüilo no palco. Como não estava de serviço, acrescentei na maleta minha garrafinha metálica de 750 ml de vodka!
Só não foi mais tranqüilo por causa dos técnicos das bandas, que eram os mesmos para as duas. Os operadores de P.A. e monitor eram gringos e o iluminador era brasileiro. Achei os alemães muito lentos, muito mesmo! Tinha tudo para ser um sound check tranqüilo, com tempo de sobra, mas acabou ficando agoniado no final. O roadie, que era gringo também e parecia um personagem exótico do filme de Harry Potter, levou uns 40 minutos só para armar uma bateria. E antes de começar a armar a outra, parou para se alimentar, pois ninguém é de ferro, não é? Nessa parada para o lanchinho, pararam todos!
Lembram que falei em algum texto que nos adaptamos ao tempo que temos para fazer o sound check? Mas neste caso, eles abusaram! A segunda banda passou o som com as cortinas fechadas do palco e com o público entrando no local.
Ah… O público… Pensem numa galera animada! Eles vibravam até com os clipes que passavam no telão! Cantavam junto como se já fosse um show. Mas todos os clipes seguiam o contexto da noite, logicamente! Ainda bem que não colocaram um comercial de uma cerveja que foi veiculado nos dois primeiros dias do festival, que tinha como trilha musical um axé, pois com certeza teria sido vaiado com fervor.
Neste dia era muito fácil me encontrar no salão, pois só vi uma camisa com a mesma cor da minha que era vermelha! Quase todo o resto do pessoal vestia preto!! Lembrei da menininha de vestidinho vermelho do filme A Lista de Schindler. Ela era a única coisa que aparecia colorida no filme que era em preto em branco, lembram?
Vamos voltar aos shows…
Os dois operadores, como muitos hoje em dia, solicitaram mesas digitais. Cada um deles trouxe a cena do último show que foi feito em Fortaleza salva no pendrive. Esta cena é passada para a mesa, fazendo com que se ganhe muito tempo com isso. Talvez isso tenha influenciado no relaxamento da equipe na hora do sound check.
Fiquei grande parte do tempo no palco observando a passada de som e pude notar algumas curiosidades, principalmente na banda Helloween. Eles não usam amplificador de guitarra microfonado, o que para muitos guitarristas puristas é uma coisa absurda! Deixo esta discussão para os guitarristas, porque para mim, se o produto final ficar legal, pouco me importa se tem amplificador microfonado ou não na jogada. O guitarrista usava várias guitarras com um único transmissor sem fio e estes sinais passavam só por um cabeçote de amplificação Marshall e por pedais simuladores de amplificadores, sendo enviados por linha (estéreo) para o som. Inclusive anotei a referência deste transmissor sem fio para usar no violão do artista com quem trabalho, pois o meu amigo Normando, que é um dos sócios da empresa de som que faz o festival, e que trabalha comigo no monitor deste artista, já tinha me alertado sobre a existência de tal equipamento.
O baixista usava caixas amplificadas no palco, mas ficavam escondidas abaixo do praticável da bateria, e isso fez com que o palco ficasse visualmente limpo. Outra coisa que pude observar foi o microfone da voz principal. Era um microfone sem fio que eu já tinha ouvido falar e que tentei uma vez fazer com que o artista com quem trabalho comprasse, pois qualidade sempre foi uma prioridade para este artista. O grande problema que encontramos foi que o preço dele aqui no Brasil era somente 32 mil reais!!!! Não tive argumentos (e nem tentei!) para convencê-lo a comprar!!
Como sabia que o som seria pesado, levei e usei meus protetores auriculares para proteger meus ouvidos, pois são minhas ferramentas de trabalho e não posso danificá-los. Fui para o local onde fica a mesa de P.A. que chamamos de F.O.H. (Front Of House), e fiquei lá ao lado do operador alemão até o final dos shows! Escutei a primeira metade do show de Gamma Ray sem os protetores para ouvir o som sem barreiras e coloquei-os na outra metade para descansar os ouvidos até o início do show de Helloween. Foi um show de competência do operador alemão! O som estava muito bom, mas muitíssimo alto! Não sou roqueiro, mas adoro um som bem feito, independente do estilo e não sei também se aquele estilo de música poderia ser apreciado em outro volume. Achei também a voz muito dentro da base musical, fazendo com que eu não entendesse direito as palavras (em inglês) que o cantor pronunciava, mas isso já é um gosto pessoal, pois sempre trabalhei com jingles publicitários em que o entendimento da palavra é a prioridade. Faço sempre isso nos shows em que opero o som do P.A., ou seja, primeiro eu tenho que entender as palavras que o cantor está pronunciando, e depois eu vou complementando com os instrumentos. Lembro-me uma vez que fui a um show de Fernanda Abreu e este show foi gravado. Escutei a gravação depois e fiquei impressionado com o resultado final. Estava tudo muito nítido e equilibrado, parecia um CD gravado em estúdio, só que no show eu não entendi nada da letra que ela estava cantando em várias músicas, pois eu não conhecia as letras! Tudo é uma questão de concepção.
No final do show de Helloween, depois de tomar toda a garrafa de vodka com um amigo meu, dei os parabéns ao alemão pelo som, e não me contendo de curiosidade, pois já fiz shows na Alemanha, perguntei com meu inglês fraquíssimo: Você usa este volume de som na Alemanha? Ele respondeu satisfeito e sorrindo: never!
Fui acabar a noitada com meu amigo Normando no mercado de Casa Amarela, tomando “as saideiras” com galinha cabidela e me perguntando se Recife mereceria tais shows! Acho às vezes o público daqui muito ingrato.
Fui dormir muito feliz por ter presenciado um grande espetáculo, e repito, mesmo sem ser roqueiro!
Um abraço a todos.
Leo Trevas,
A produção do Helloween proibe qualquer tipo de venda de discos ou camisas durante os shows. Existia uma única barraca lá, que era a da própria banda. Todo o merchandising do show tem que ser deles.