Deixemos as questões estéticas de lado e vamos tentar nos ater aos aspectos ideológicos: João do Morro está para o Morro da Conceição assim como Cannibal para o Alto José do Pinho. Ambos são fenômenos periféricos, adeptos da cartilha do “faça você mesmo” e, cada qual ao seu estilo, retratam o cotidiano de suas comunidades. Só que ao contrário do politizado vocalista do Devotos, o viés de João do Morro é o deboche, o escracho. E, sim, o cara é muito competente no que se propõe. Esbanja presença de palco, as letras são muito bem sacadas (o hino gay “I Will Survive” se transforma em suas mãos na impagável “Wilson Vai”) e ele parece prestes a decolar. E, quer saber? Tomara que decole mesmo.
Noite de quinta-feira. Concentração de gente na frente do 100% Brasil. A economia informal tenta faturar uns trocados: barraquinhas vendem churrasquinho e caldinhos, estes vendidos também por ambulantes. Entre os consumidores, gente que se produziu especialmente para a noite: casais e gente que pretende sair de lá acompanhada. Numa das mesas, a banda de João do Morro se descontrai entre uma cerveja e outra antes do show. Eis que sou apresentado ao homem. Camiseta preta, calça jeans e uma enorme corrente de prata, me cumprimenta de forma educada e parece ainda não ter se dado conta do sucesso que faz. A banda fecha a conta. Hora de segui-los até dentro do recinto.
O ingresso custa cinco reais, e o lugar está bem próximo da lotação. No palco, um apresentador gordinho trata de animar a platéia com um concurso bizarro: chama cinco voluntários para subir ao palco. Cada um precisa virar uma garrafa inteira de cerveja, sem “vazar” (escorrer cerveja pela boca) e sem tirar a boca do gargalo. Quem virasse mais rápido ganharia cinco cervejas de prêmio. Desajeitados, todos acabam eliminados, e a competição fica sem vencedor. Um pequeno camarote da altura de dois degraus é improvisado perto da mesa de som, à direita do palco. Nele, algumas garotas começam o expediente, e, a pedido do apresentador, começam a soltar frases de efeito no microfone: “É hoje que eu só volto amanhã”. “É hoje que eu boto uma gaia bem massa naquele corno”. E, a mais mimosa de todas: “Eu quero mamar!”. O apresentador se empolga: “Pessoal, hoje a noite é completa. O motel Lua de Mel está com uma promoção de R$ 11,90 e aceita todos os cartões. É hoje!”. E prova que a noite era aquela mesmo: “Aproveitem. O camarão hoje está por R$ 9,90”. Recados dados, público aguçado e atiçado e João do Morro e banda são convidados para entrar em cena. E, corajosos, abrem logo com “Ei Boyzinho (papa frango)”. O lugar inteiro vai ao delírio. Ninguém fica parado, e até os garçons tratam de servir os clientes dançando, tornando sua jornada de trabalho menos sofrida.
E não é que a banda é boa? Artur (percussão), André (guitarra), Adriano (baixista que tocou com o pé torcido), Aloísio (teclado), Keko (cavaco), Miza (bateria) e Tio (percussão) seguram a onda bonito, e imprimem até um certo peso a algumas das músicas. Na seqüência vem “Chupa que é de Uva”, e João se revela um frontman e tanto: provoca a platéia, rebola e dança tal qual um Mick Jagger do samba. Emendam com “3 Segundos”, e é impressionante como a platéia canta todas as músicas. O mesmo acontece com “Gigolô”, que segue a mesma temática de “papa frango”. E vem o melhor da primeira parte do show, que fica por conta de “As Nega Endoida”. Cada coreografia mais “linda” do que outra na platéia.
Vem a sexta música e a impressão é que o cara só tem hit no repertório: “Sinal de Puta” é espertamente colocada ao lado de “Putaria”, um mapeamento do Recife através dos puteiros da cidade (“Casas de Furança”). De deixar sociólogo com inveja. É hora então de “Frentinha”, cuja coreografia pélvica deixaria Elvis com as faces coradas. E o achado poético da noite: “Bicha Boa do C…”, do verso “boa é mãe, legal é pai, tu é gostosa pra carai…”. Logo após ele anuncia uma singela canção de título “Sarrar”. Uma moça, das mais ativas na platéia, mostra que essa história de sarro é pura perda de tempo: “sarrar não é comigo!” Suas coreografias eram a prova indubitável disso. O mais bacana é que tudo isso acontecia num clima de paz e de tranqüilidade, sem confusão alguma, com vários casais de namorados curtindo o show e gente que parecia estar ali para de fato ver o novo ídolo.
Quando você pensa que já viu tudo, vem o melhor do show. A versão para o clássico gay “I Will Survive”, que se transforma, nas mãos de João do Morro, na hilária “Wilson Vai”, com letra que relata a história de um certo rapaz que descobre a felicidade ao se assumir. Genial!
Após uma homenagem ao falecido cantor Pinga do Brega, do Alto José do Pinho, a banda encerra com “Balaigem” e sai do palco bastante aplaudida.
João do Morro deve ser encarado como o que é de fato: pura diversão, assim como Reginaldo Rossi. Não vai mudar o mundo. Não é a nova voz da verdadeira cultura suburbana. Mas também não é produto plastificado e falso dela. Ao contrário, encontrou um caminho original e debochado para falar de questões que estão bem próximas de sua realidade. E, na moral, é a coisa mais rock, no que ele tem de rebeldia e de deboche, a surgir em Pernambuco nos últimos anos. No final do show, comprei o CD e fiz questão de pedir autógrafo.
Mas, clichê dos clichês, o melhor da noite mesmo estava reservado para o fim: o apresentador avisa no microfone: “quem estiver de carro e for para Olinda, por favor, tome muito cuidado e evite a beira-mar. Está tendo uma blitz pesada da polícia lá e eles estão parando todo mundo que bebeu”. Isso é que é solidariedade e serviço de “utilidade pública…” Será que dá para dar um recado desses numa ligação de três segundos ?
21 Comments
que beleza!
se fala mais de joão do morro aqui do que de bandas de rock que tão pra fazer show e que não tão mais divulgando. viva o pagode!
O que Hugo estava fazendo no 100% Brasil? foi por acaso que ele foi ao swow de João do Morro ou será que ele foi convidado para fazer essa cobertura?
No Primeiro caso, fica demostrado o ecletismo desse jornalista que nos momentos de lazer vai ao Pagode e no segundo caso,fica a impressão de ser uma materia paga ou para um amigo particular.
Contudo fica a pergunta, porque em um site especializado em rock falar em pagode(ou coisa do genero)? sera que para esse jornalista o Rock é somente atitude? e ainda mais esse tipo de atitude?
Gente vamos valorizar a musica, que é o principal elemento do ROCK AND ROLL.
Aproveitando o gancho do Fernando, vou divulgar os proximos shows da Amps & Lina:
Amps & Lina convida: Julia Says e Electrozion
DIA 06 DE JULHO
No bar Quintal do Lima, domingo, a partir das 16hs. Rua do Lima, 100, st. amaro
Shows com as bandas JULIA SAYS + ELECTROZION + AMPS & LINA
Discotecagem: Cleiton Shelley.
Ingressos: R$ 5,oo
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Amps & Lina convida: Milla Bigio e Mellotrons
DIA 13 DE JULHO
No bar Quintal do Lima, domingo, a partir das 16hs. Rua do Lima, 100, st. amaro
Shows com as bandas AMPS & LINA + MELLOTRONS
Abertura:Milla Bigio
Discotecagem: Viviane Menezes.
Ingressos: R$ 5,oo
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DIA 26 DE JULHO
Show no FESTIVAL DE INVERNO DE GARANHUNS
Sábado, no PALCO POP, Praça Euclides Dourado. Entrada Gratuita
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DIA 27 DE JULHO
Pocket show na Livraria SARAIVA
Domingo, a partir das 18hs, no Shop Recife. Entrada Gratuita
Valeu!!!
Comentário ????
Olhando o que acharam da cobertura, um acha que música é uma coisa só, Rock é toda manifestação fora do comum, ou seja toda música é Rocker !!!!
E dois, colocar agenda da banda aqui é lasca, manda pra Hugo e ele coloca na “Agenda”.
poderia passar por aqui sem essa….
Hugo ta de parabens…
não adianta reclamar pq esse site eh do “ROCK”..
A muito não aparece no Recife algo tão underground quanto João do Morro…
‘Pagode não faz meu estilo mas, o som do cara eh muito engraçado e merece ser ouvdo num sábado a tarde na hora da cervejinha que é de lei!!!
quem gosta de boas risadas não devia desperdiçar personagens como o João do Morro e sim ter orgulho desse cara ser Pernambucano…
Parabéns a Hugo pela cobertura e a João do Morro pelo espetáculo que deve ser o show… que infelizmente ainda não vi!!
hehe
PAZ!!!
Eu estava lá. O show de João é muito bom. Ele tem o carisma de uma estrela sem afetação alguma. Eu, de minha parte, também não sou adepta do pagode, mas João é muito mais do que isso, vai além dessa celeuma. É música para se divertir, chacoalhar o esqueleto, é conhecer outro lado da cidade que não chega até nós, de uma forma mais do que franca.
Já fui a três shows dele. E recomendo. Quem ainda não teve oportunidade, pode arriscar. É diversão garantida ou seu dinheiro de volta.
RMRO me leva pro próximo??
rsrsrs
Muito massa Hugo… João do Morro, como vc tão bem definiu, é um personagem carregado de humor e que transmite nas suas músicas aspectos (grotescos ou não) de tudo que vive em seu cotidiano periférico.
Acho lamentável que alguns leitores do site sejam tão bitolados. Fico imaginando o que esse povo não deve deixar de fazer para assumir uma postura Rock and Roll.
Engraçado que roqueiro adora usar camisa de Raul Seixas e eu to procurando até hoje algo mais brega (maravilhosoooo) do que Raul.
Inovação e originalidade merecem atenção sim…
Adorei a cobertura…Demorou…
“Ei, Huguinho você é papa frango.”
João do Morro Rocks!
Acho muito válido qualquer tipo de expressão musical. E claro, seu público e espaço reservados para isso.
Vamos relembrar quantos espaços na mídia esse tipo de som ofensivo, degradante e preconceituoso possui? Diversos!!!
Sabe, antes de tudo, temos que pensar de maneira mais ampla. Digamos mais sociológica da questão. Como as mulheres e os homossexuais são retratados nesse estilo musical? Levantar bandeira para esse tipo de expressão e apoiar os diversos crimes (físicos e verbais) existentes contra essas minorias.
Pior, achar interessante a solidariedade do apresentador em informar a existência de uma blitz policial foi o cúmulo. Sabemos quantas pessoas morrem em acidentes, devido aos irresponsáveis que bebem demasiado.
Enfim, acho que este espaço é direcionado a um determinado público, que consome determinado tipo de música.
Na cidade, estão ocorrendo muitos eventos que não possuem projeção na mídia, inclusive aqui. Os eventos são enviados ao Recife Rock, mas se não divulgam, então quem ta correndo atrás vai e divulga, caro Nelson Ribeiro.
Cúmulo mesmo é apoiar a degradação do ser humano.
Yara, minha cara: vai pra missa rezar que é o melhor que vc faz. Deixa o povo na putaria, filha!!
JOAO DO MORRO TAMBÉM É ATITUDE!!!
João do morro é massa…
Ah massa!!! Vamos mudar o nome desse site RecifeBrega, RecifePagode, RecifeFunk…
Olha, sinceramente. Agora escutar pagode é cult. Depois do bonde do role, agora é a vez do pagode????
Sei não… Parece o português quando chegou na Terra de Vera Cruz e olhou os índios de maneira pitoresca…
Vamos pro morro agora, 100% Brasil o que mais? Não tem mais nada na cidade acontecendo, né?!!!
Sinceramente!!!
falar de joão do morro uma vez beleza, ok… é uma coisa diferente, exótica, vinda da periferia e com atitude. mas nos últimos dois meses, aqui só se fala em joão do morro. até na coletanea do grito ele tava na faixa escondida. enquanto isso a galera que tem banda de rock fica sem ter divulgação que precisa. e hugo deixa de fazer cobertura dos shows q acontecem pra ficar indo pro 100% brasil. rolou canivetes no geraldão na sexta-feira e cadê esse povo por lá?
Cada qual com a sua razão! Não curto o pagode ou brega, e nem acho um tanto produtivo a apologia ao sexo e a “degradação” da imagem da mulher, mas acho que se não damos espaço ou fingimos que não existe essa realidade vai ser sempre assim, porque ao invés de críticar o som por ser “preconceituoso, ofensivo e de mal gosto” não vamos conhecer melhor a realidade em que essas pessoas que vivem ou curtem isso frequentam! Queria so saber o que vocês achariam de tudo isso se tivessem nascido num barraco na beira do capibaribe ou num morro sem quase nenhuma salubridade tendo que trabalhar desde jovem pra sobreviver sem condições mínimas de educação! Não quero generalizar porque sei que não são todos que vivem nessas condições, mas quero alertar para todos nossos próprios preconceitos e lembrar que este é o reflexo de nossa sociedade! Se é “degradação do ser humano”, é por culpa de todos! Não culpem eles por viverem disso ou curtirem esse tipo de som, eles não são culpados sozinhos!
Tão menosprezando a nova voz do pagode pernambucano né? Esse Hugo sei não… É um erudito mesmo.
Parabéns Hugo, como falaram acima, é um espaço
também para as músicas Underground de recife,
todo tema tem que ser aberto a oportunidades,
e confesso, que apesar de odiar pagode, adoro o som
do João do Morro, cara super gente fina.
Hugs All.
Mick Jagger do samba. ????????????
Isso é swingueiraaaaaaaaaa
o samba q eu conheço é outro.
:))
eu adoro joao do morro eu dou do sombra
e quando ele veio pro arraial da juventunde aqui
na rua da lagoa eu adorei sou papa frango e como
ele tbm considero mc leo da lagoa e pink
Alguém sabe o número do telefone do 100% Brasil?