Cobertura: Arnaldo Antunes na Concha Acústica da UFPE

Por Hugo Montarroyos em 31 de outubro de 2009

Sua banda é incrivelmente boa, e suas composições ganham muito com ela.

Arnaldo Antunes na Concha Acústica da UFPE

E lá se vão 15 anos desde que Arnaldo Antunes saiu dos Titãs. E, de lá para cá, deixou de ser o esquisitão do grupo, dono das melhores letras da banda, para abraçar uma carreira solo esquizofrênica, com duas vertentes antagônicas e que a princípio não dialogavam entre si. Ele passou a ser o cara que lançava discos experimentais, de difícil acesso, quase incompreensíveis, para ao mesmo tempo se firmar como compositor pop e artesão de hits para vários artistas, como Marisa Monte, Cássia Eller e o seu Tribalistas.

O que nos motivou a cobrir o show de Arnaldo Antunes foi tentar descobrir se ele tinha público no Recife, e qual o perfil dele. Pois não é que ele tem fãs por aqui! E eles compareceram em bom número, ontem à noite, no show de lançamento de “Ié, Ié, Ié” na Concha Acústica da UFPE. E é uma plateia bem diferente da que estamos acostumados a ver em shows de rock. A média de idade gira em torno dos trinta/quarenta anos. Muitos casais no local, várias meninas na casa dos 25 anos na frente do palco e até mesmo senhores e senhoras nas últimas fileiras acompanhando e cantando várias das músicas.

“Ié, Ié, Ié” é o trabalho mais pop da carreira de Arnaldo, e tem como fio condutor a Jovem Guarda. Antunes se cercou de um banda impecável, com André Scandurra (guitarras e vocais), Curumim (bateria e vocais), Beto Aguiar (baixo e vocais), Chico Salem (violão, guitarra e vocais) e Marcelo Janeci (teclados e vocais). Com um time desses, dificilmente algo daria errado. O show, patrocinado por uma empresa do ramo de cosméticos, tem produção luxuosa. O cenário do palco é recheado de referências ao mundo pop. A banda toca vestindo terno e gravata. O som é bem mais cristalino do que o habitual na Concha.

Celebrado pela crítica como melhor álbum de Arnaldo Antunes, “Ié, Ié, Ié” ganha impressionante contorno roqueiro ao vivo. No show, o disco fica mais forte, mais pesado, com mais pegada. Curioso notar que Arnaldo Antunes, que já declarou que canta de três formas diferentes (“canto falando, canto gritando e, às vezes, canto cantando”) se aproveite do fato de que todos em sua banda cantem melhor do que ele. E é esse casamento entre o vocal desajeitado de Antunes com a fluência pop dos backing vocais perfeitos que confere à tudo um resultado bem original e interessante.

O show começa com um vídeo em que o cantor fala sobre formas de compor e de como a música tem a capacidade de mexer com toda a estrutura corporal. Depois, as caixas de som emitem “Já Fui Uma Brasa”, de um Adoniran Barbosa que então cantava “eu gosto dos meninos desses tal de ié, ié, ié, porque com eles canta a voz do povo”. A banda entra e ataca com a faixa título, emendando com “Vem Cá” e a polêmica “Essa Mulher” (sobre um mulher que prefere se masturbar ao invés do “membro” do seu suposto namorado), e lança a primeira surpresa da noite: o clássico “Americana”, de Dorgival Dantas, aquela do “Ela é americana da América do Sul”. Só então, depois de quatro músicas e público já conquistado, Arnaldo se dirige a plateia para dar “boa noite” e agradecer a presença de todos.

Sua banda é incrivelmente boa, e suas composições ganham muito com ela. No palco, ele continua com as mesmas danças robóticas/macumbeiras que eram sua marca registrada nos Titãs. E também tem coragem de, em determinado momento do show, descer do palco e cantar junto do público, abrindo caminho entre eles para a alegria das dezenas de fotógrafos amadores.

Arnaldo Antunes na Concha Acústica da UFPE

A escolha dos covers acaba revelando que o atual tema preferido do cantor é a dor-de-cotovelo. Assim o são nos casos de “Quando Você Decidir”, de Odair José, “Vou Festejar”, de Jorge Aragão, imortalizada por Beth Carvalho (do famoso refrão “você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão). E, a mais interessante de todas, que há tempos faz parte do repertório de Arnaldo: “Judiaria”, de Lupcínio Rodrigues, que nas mãos de Antunes se transforma num rock raivoso que combina perfeitamente com a letra mais irada já escrita sobre fossa. Vale até a transcrição completa dela e a dica para conferir as duas versões para ver como um cover pode ser a reconstrução de uma música. Eis o sarrafo de Lupcício: “Agora você vai ouvir aquilo que merece /As coisas ficam muito boas quando a gente esquece/ Mas acontece que eu não esqueci a sua covardia, a sua ingratidão /A judiaria que você um dia fez pro coitadinho do meu coração / Estas palavras que eu estou lhe falando /Têm uma verdade pura, nua e crua /Eu estou lhe mostrando a porta da rua.
Pra que você saia sem eu lhe bater /Já chega um tempo que eu fiquei sozinha / Que eu fiquei sofrendo, que eu fiquei chorando / Agora quando eu estou melhorando /Você me aparece pra me aborrecer”. Música mais pesada do set, foi inteligentemente usada por Arnaldo para fechar o show, em bis que contou também com o hit “Socorro”, cantado por todos e saudade com um “Ficou bonito pra caramba, hein”, por Antunes, e “Luz Acesa”. Antes, mostrou “Meu Coração”, parceria dele com o pernambucano Ortinho.

Ainda que seja muito menos pop do que seu ex-colega Nando Reis, Arnaldo Antunes começa a seguir um caminho mais “digerível”, sem abrir mão de seu lirismo por vezes perturbador. Suas letras continuam afiadas. Seu show dá a sensação de passar rápido, e o público sai do local mais do que satisfeito. Acho que outro bis seria até bem-vindo, mas parece que Arnaldo achou o timing certo. Algo me diz que ele está cada vez mais próximo da lavra de Nando Reis. E isso, definitivamente, não é demérito.

Set List
Ié, Ié, Ié
Vem Cá
Essa Mulher
Amercana (Dongival Dantas)
A Casa é Sua
Invejoso
Consumado
Um Quilo
Longe
Envelhecer
Pra Aquietar (Luiz Melodia)
Meu Coração
Sua Menina
Pedido de Casamento
Quando você Decidir (Odair José)
Sim ou Não
Vou Festejar (Jorge Aragão)
O que você quiser

Bis
Socorro
Luz Acesa
Judiaria

8 Comments

  1. Posted 31 de outubro de 2009 at 21h32 | Permalink

    Curumim toca bateria, né não, Hugo?

    Abraço, bróder!

  2. Posted 1 de novembro de 2009 at 4h04 | Permalink

    Putz! Não sei como consegui tamanha “façanha”. Valeu, John!
    Corrigido!

    Abraço!

  3. Posted 1 de novembro de 2009 at 9h59 | Permalink

    “André” Scandurra (guitarras e vocais)????

    Eu o conheço como Edgard Scandurra. Se eu estiver errado me corrijam por favor!

  4. Leo
    Posted 1 de novembro de 2009 at 11h51 | Permalink

    verdade.. era o edgar! =] que showzaço! tem imagens do palco? tava lindo aquilo lá! =]

  5. Posted 1 de novembro de 2009 at 13h17 | Permalink

    Leo, eu tenho algumas fotos do Show! se vc quiser me passar seu e-mail, te envio numa boa ok!

    Abraço!

  6. Diego Miranda
    Posted 2 de novembro de 2009 at 0h43 | Permalink

    Show redondinho. Muito foda!

  7. Posted 3 de novembro de 2009 at 0h24 | Permalink

    Eis um artista que vale a pena!

  8. paulo
    Posted 29 de julho de 2010 at 22h40 | Permalink

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