Texto de Carolina Santos no Diário de Pernambuco de hoje:
Artistas pernambucanos reagem contra a programação da Empetur para o estado
Quando foi divulgada na segunda-feira (21), a programação do carnaval de Pernambuco causou estranhamento imediato. Nomes tradicionalmente alheios ao carnaval do estado estavam presentes em profusão. O grupo paulistano de pagode Art Popular, por exemplo, irá tocar sete vezes durante o carnaval: em Bezerros, Jaboatão dos Guararapes, Paudalho, Nazaré da Mata, Triunfo, Timbaúba e Ipojuca. Outro caso, da banda de pagode Revelação, é ainda mais peculiar. Somente na noite do sábado de carnaval a banda vai se apresentar em três cidades diferentes do interior: Goiana, Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata, e Bezerros, no Agreste, numa distância total de 165km. Além disso, a banda se apresenta no mesmo dia no Caldeirão Vip, no Galo da Madrugada.
Como era de se prever, a programação gerou indignação nos artistas locais, que logo começaram a protestar na internet, pelas redes sociais. Ontem, cerca de 50 artistas e produtores se reuniram na Torre Malakoff para definir os protestos contra a grade divulgada pelo governo do estado. O principal ponto questionado na reunião foi o edital lançado pla Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) em dezembro para que artistas locais participassem do carnaval. ´A informação que tivemos é que foram cerca de 800 inscrições e não nos disseram que foram os selecionados`, comentou a produtora e percussionista Gabi Apolônio.
Para o produtor Paulo de Castro, a grade do carnaval reflete o que acontece nas festas do interior. ´Há muito dinheiro público sendo usado não para promover a cultura local, mas sim para bandas que estão no mercado, que pagam jabá. É um tipo de estética que se alastrou pelo interior e agora chega ao carnaval`, reclamou. Para Adriano Araújo, do Fórum Permanente de Música de Pernambuco, houve um retrocesso na política cultural. ´Um dos principais comprometimentos do governo com a cultural local é a difusão, feita através de shows, e isso não está sendo realizado`, disse.
Na reunião, que começou pela manhã e seguiu até a tarde de ontem, foi definida uma pauta de reivindicações que a comissão de artistas pretende entregar ao governador Eduardo Campos. ´Ele fez uma promessa de governo de proteger e incentivar a cultura pernambucana. Essa política não está sendo cumprida`, disse o maestro Ademir Araújo.
Para o músico Luciano Brainner o governo tomou uma decisão infeliz ao entregar o carnaval à Secretaria de Turismo. ´Quem tem que definir é a Secretaria de Cultura, com pessoas que conheçam o que propõem e valorizem a riqueza da nossa cultura`, disse. Depois da reunião, 15 artistas participaram da elaboração do documento que será encaminhado a Empetur e à Secretaria de Cultura.
Alguns artistas queriam entrar de imediato com um processo no Ministério Público pela suspeita os aprovados no edital não foram aproveitados na programação. A maioria, porém, preferiu esperar uma resposta do governo. Na próxima segunda-feira, haverá nova manifestação. (Carolina Santos)
fonte: http://www.diariodepernambuco.com.br/2011/02/25/viver4_0.asp
Versão do governo
Com a Fundarpe envolvida em processos por desvio de verba e devendo a artistas cachês do carnaval do ano passado, o governo do estado delegou à Secretaria de Turismo (Setur), órgão ao qual a Empetur está vinculada, a tarefa de articular o carnaval pernambucano. Quando foi anunciado no começo do mês que a Empetur iria ficar responsável pelo carnaval, o presidente do órgão, André Correia, assegurou que iria respeitar o edital e os shows seriam monitorados – para evitar denúncias de apresentações fantasmas como as que ocorreram com a Empetur no ano passado.
Ontem, os secretários de Turismo e Cultura preferiram não conversar com o Diario, e emitiram notas oficiais. A Secretaria de Turismo afirmou que ´para a montagem (da grade) dialogamos com as prefeituras e com a Fundarpe, utilizando as inscrições nos editais de cultura como referência para os palcos`. A nota ainda informa que ´serão 209 shows, sendo 149 deles realizados por artistas pernambucanos (71%)`.
Em um arquivo anexo, a Empetur grifou de vermelho os artistas que trabalham com ´ritmos tradicionais do carnaval, como frevo, maracatu, ciranda, samba e coco de roda`. A classificação da Empetur, porém, abarca a banda cover de pop rock Nós 4 e o pagode da Big Big Samba Clube, grupo que faz o circuito de boates recifenses.
Faltando apenas uma semana para o início do carnaval, a programação do estado não estava ontem nem no site da Secretaria de Turismo, nem no site oficial do carnaval (www.carnaval.pe.gov.br). De acordo com a assessoria de imprensa da Setur, a grade foi retirada do ar porque outros artistas ainda deverão entrar na programação. A Secretaria de Cultura se limitou a informar que o edital do carnaval não foi revogado e o resultado do ranking deverá ser publicado no site da Fundarpe ´em breve`.
fonte: http://www.diariodepernambuco.com.br/2011/02/25/viver4_1.asp
Depoimentos
“Há dois problemas na programação. O primeiro é que foi lançado um edital e esse edital foi desrespeitado, na medida que a Empetur se lançou à frente e divulgou essa grade que está aí. Em consequência, essa grade, com raríssimas exceções, não representa nossa cultura. Temos que tentar reverter essa programação`
Geraldo Maia, cantor
Essa grade não representa a tradição cultural pernambucana. Não se trata de preconceito. Se o governo representa o povo e os artistas pernambucanos, por que quer promover o carnaval daqui usando a música da Bahia? Isso nega toda uma tradição. Não tem sentido o governo gastar dinheiro do povo para promover um carnaval que não representa a cultura daqui`
Ivan Moraes, músico
O edital tem que ser respeitado. Os maiores penalizados são as agremiações carnavalescas, que já trabalham sem condições. Eduardo Campos se propôs a construir um carnaval popular e, de repente, a equipe dele não faz isso. É um contrassenso fazer um edital e não aproveitar os artistas que se inscreveram`
Maestro Ademir Araújo
A grade é uma aberração. É uma quebra de todo um processo de política cultural. Sob a bandeira do multiculturalismo se esconde uma série de oportunismos mercadológicos. Fiquei surpreso com a profusão de bandas ligadas ao pagode. Lamentável`
Luciano Brainner, cantor
fonte: http://www.diariodepernambuco.com.br/2011/02/25/viver4_2.asp