O Assutado Discos é uma das iniciativas mais bacanas a surgir no mercado musical brasileiro nos últimos anos. Capitaneado por Rafael Cortes, o selo tem como principal missão garimpar raridades de artistas nacionais para lançá-las em vinil. Até agora, a Assustado Discos já lançou vinis dos Inocentes, Devotos e Wander Wildner, e está em processo de conclusão de um álbum de DJ Dolores. Na entrevista abaixo, feita por e-mail, Cortes explica qual a proposta do selo, faz um balanço do mercado atual do vinil e fala sobre os trabalhos de outros artistas que pretende lançar.
Como nasceu a ideia de criar a Assustado Discos?
O principal objetivo do selo é possibilitar que gravações raras, inéditas e históricas de artistas que já tenham uma estrada possam ser disponibilizadas para o público. Esse desejo por raridades me acompanha desde a adolescência, quando eu buscava os discos “piratas”, normalmente gravados ao vivo, das minhas bandas prediletas. Até hoje garimpo essas raridades e encontro pessoas com o mesmo interesse. Portanto, decidi viabilizar parte desse fetiche através do Assustado Discos. A vontade de criar um selo é antiga, o formato foi se lapidando com o tempo.
Qual o critério de escolha dos artistas?
Com o selo pretendo trabalhar com parceiros, pessoas que tenham o mesmo interesse e afeto em disponibilizar conteúdos dentro do conceito do Assustado Discos. Até agora, trabalhei com pessoas que já tenho proximidade ou que apareceram no caminho do selo e houve empatia por ambas as partes. O importante é ser música com verdade. Mas vale lembrar que a proposta do Assustado Discos é lançar material de bandas e artistas que já tenham uma história na música.
Como os artistas encaram a proposta do selo?
Normalmente, os artistas que tenho contatado tem se interessado bastante pela proposta e formato de trabalho do Assustado Discos. Assim como eu, eles vêem a oportunidade de disponibilizar para o seu público áudios muitas vezes esquecidos e que provavelmente nunca seriam remasterizados e lançados no formato vinil.
Qual é, em média, a tiragem de cada disco?
500 (quinhentas) cópias. Artigo de luxo.
A proposta do selo sempre foi resgatar material inédito das bandas?
Sim, na verdade o resgate é de materiais raros e inéditos, não necessariamente de músicas inéditas, Por exemplo, disponibilizar versões demos de clássicos da banda, músicas com arranjos diferentes,
materiais ao vivo, projetos paralelos dos artistas e por ai vai. São os chamados bootlegs.
Como você avalia, atualmente, o mercado de vinil no Brasil?
Em um processo lento mas contínuo, o mundo está retomando a cultura do uso do formato de disco em vinil, existindo já um mercado cada vez mais crescente nessa área. O crescimento das vendas de vinil no Brasil, a julgar pelos números da Livraria Cultura, que é a maior vendedora do formato, cresceu 35% nos últimos dois anos. A venda online de discos de vinil está aumentando no mundo com o surgimento de novas plataformas disponíveis em smartphones e e-commerce dedicados exclusivamente a vendas do formato, tornando o “vintage” muito mais próximo do moderno. No comércio eletrônico brasileiro, os vinis vem superando, desde 2011, a venda de BlueRays e DVDs. O formato também está contribuindo como uma forma de combate ao comércio ilegal de distribuição de música. O mercado americano é o único que tem estatísticas precisas para isso e aponta um crescimento de ordem de 50% nos últimos dois anos. As vendas em lojas americanas já chegam a 4 milhões de discos/ano, mas um levantamento feito junto às fábricas, mostra que a produção já passa de 10 milhões (diversos músicos fabricam e vendem discos de vinil diretamente em shows, sem passar pelas grandes lojas). As principais gravadoras européias e norte-americanas, por exemplo, estão editando cerca de 70% de seus catálogos anuais em formato vinil.
A Assustado já lançou material do Devotos, Inocentes e Wander Wildner, e está trabalhando agora para o lançamento de um projeto do DJ Dolores. Você já tem em mente outros nomes que pretende lançar?
O selo tem conversados com alguns artistas, teremos muitas novidades ainda em 2013. Estamos buscando estratégias de financiamento para possibilitar a auto-sustentabilidade do selo, então muitos projetos estão nessa dependência. Mas para adiantar algumas “bolachas’ possíveis, devemos lançar um compacto com raridades do Little Quail and Mad Birds em parceria com um selo novo de Brasília, um LP duplo do coletivo re:combo. Tem parcerias com o selo pernambucano Joinha Records que irão se concretizar e por ai vai. Volto a falar com o Recife Rock! quando as coisas estiverem mais fechadas, ok?
Se quiser acrescentar algo, o espaço é seu!
O nome Assustado Discos foi inspirado nas festas “improvisadas” que aconteciam na década de 70 e começo dos 80 em Pernambuco. Desde a minha chegada na cidade, há pouco mais de 6 anos, encantei-me com o nome da tal festa que normalmente era animada por vitrolas portáteis e discos de vinil. Essa ideia de que a música já poderia ser portátil nessa época e que o bom e velho bolachão também tinha sua praticidade de certa forma contrapõe-se a certos discursos atuais. Para minha surpresa, a definição da palavra “assustado” no dicionário, traz referência a esses momentos.
O Assustado Discos pretende atender aos colecionadores e fãs de materiais raros. Desde já sei que nunca atingirei a grande indústria e esse não é o objetivo. Os discos terão tiragens reduzidas e serão quase como objetos de arte, já que além do conteúdo, as capas receberão um tratamento especial, sendo desenvolvidas por artistas plásticos. O logotipo do selo, por exemplo, foi criado pelo artista plástico pernambucano Rodrigo Braga.
O formato vinil sempre me interessou pela possibilidade de ter uma capa num tamanho maior e de ter o lado A e o lado B, que podem ser complementares ou não. Além disso, o aumento da procura e interesse pelo formato é uma realidade, hoje reencontramos prateleiras de vinil nas principais lojas especializadas do mundo e o retorno de lojas que trabalham especificamente com o formato, no Brasil.
Quando trato os discos quase como objetos de arte, me refiro à exclusividade que cada um tem. São objetos únicos e numerados, que em pouco tempo se tornarão raridades pela pequena tiragem. Essa música “difícil” também faz parte da história do universo musical, principalmente dos colecionadores.
Acredito que esses discos inevitavelmente irão parar na internet, e eu não sou contra essa realidade, a única coisa que pretendo preservar é a vontade das pessoas de possuir um objeto exclusivo e raro.
As lojas especializadas em vinil estão voltando com força total, o Assustado Discos mantém relação com lojistas no Brasil inteiro. Além disso, o selo pretende disponibilizar nas prateleiras das grandes livrarias e através da internet, que é a grande aliada das iniciativas independentes atualmente.
Lançamentos já realizados e disponíveis no mercado:
Devotos – Demos e Raridades (2011)
Inocentes – Garotos do Subúrbio (2012)
Wander Wildner – Rodando el Mundo (2012)