Resenha – Bruno Souto – Estado de Nuvem

Por Hugo Montarroyos em 17 de outubro de 2013

Bruno Souto

 

Se pensar bem, até que demorou para Bruno Souto lançar seu primeiro trabalho solo. Após a boa reputação merecidamente conquistada ao longo de dez anos e três discos à frente do Volver, Bruno deixa um pouco de lado a alegria irônica de sua banda para compor um álbum praticamente monotemático. Porque este “Estado de Nuvem” é, antes de tudo, um disco que fala de amor. Que teria tudo para soar extremamente brega. Mas que, nas mãos de Bruno, é como se Odair José ganhasse uma roupagem moderna, antenada, sonoramente prolixa e musicalmente impecável. É possível dizer que Bruno deu um passo à frente de sua banda. Mas são os detalhes tão pequenos dos dois brunos que acabam ficando mais evidentes e encorpados nessa sua nova caminhada. Um bom exemplo é a participação de Guizado em “Cansaço”, que torna a canção um quase reggae. Ou o clima praiano de “Eu e Verão”. É difícil imaginar uma delas no repertório do Volver.

Já “Se Você Quiser” traz um quê de melancolia que já era possível encontrar em outras composições dele, mas que aflora de forma praticamente inédita de tão desnudada como apresentada aqui. “Me deixa ter a chave para que eu possa abrir teu coração para refazer a casa inteira”, implora um Bruno que parece calejado pelas mágoas da vida e disposto a fazer uma faxina emocional em sua obra. Bruno consegue algo muito difícil: ao mesmo tempo em que todo o disco tem um clima de rádio AM, tudo é feito com tamanha inteligência e capricho que, em tempos de crise criativa da indústria musical mainstream, chega a soar o cúmulo do absurdo o fato de uma canção como “Avesso” não ser parte de trilha sonora de novela da Globo. O teclado e o refrão de tal música são exemplos típicos do pop do mais alto quilate, de gente como Lulu Santos e Roberto Carlos quando acerta no alvo: “E me derrama mais que o teu avesso/ Na tua correnteza a me afogar /E sinto novamente o mesmo medo/De não poder sequer chorar”.

O Volver já é consolidado há um bom tempo pela crítica como uma das bandas idependentes mais importantes de sua geração. Chega a vez, agora, de Bruno ser reconhecido como um compositor do primeiro time da música brasileira. De “Você que Pediu”, primeiro hit do Volver, até este “Estado de Nuvem”, o que vemos é uma evolução que pode soar dolorosa, sofrida, rasgada. Algo que só é conquistado quando se apanha muito. Bruno conseguiu transformar tudo que viu e viveu nesses anos em matéria-prima para este disco. Impossível achar que o álbum traz uma linha sequer que seja impessoal. Trata-se de um trabalho que exala coragem em todos os poros. De quem, há muito, descobriu seu papel na vida. E o de Bruno Souto, em pleno estado de nuvem, é ser artista. Cabe ao ouvinte ter o bom senso de apreciar sem moderação.

 

Cotação – Ótimo

 

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